Resenha: Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo

Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo é a nova película da Netflix e grande vencedora de Sundance neste ano. É um filme de solidão e desesperança sobre o que este mundo se tornou, contado através de personagens excêntricos, em ótima atuação de Melanie Lynskey (a Rose de Two and a Half Man em uma referência comercial ou a Pauline de Heavenly Creatures para uma referência cult) e Elijah Wood (outro que já trabalhou com o diretor de Heavenly Creatures, em Lord of the Rings).

Alerta de spoiler!!!

Lynskey é Ruth, uma assistente de enfermeira que se afunda cada vez mais em depressão pela dinâmica atual do mundo moderno, tomado por individualidade extrema, falta de gentileza e respeito. A primeira parte do filme concentra-se em mostrar isso de forma bem-humorada e às vezes até escrachada com pequenas situações do dia-a-dia. Seja o carro que não dá lugar ao pedestre, as últimas palavras racistas da idosa doente ou o babaca do bar que estraga a surpresa do livro que você está lendo, quando poderia ser alguém bacana de se conhecer e com um elo em comum.

Neste momento, a identificação com Ruth é forte e nunca mais você abandona ela, mesmo com as transformações que virão a seguir. Pois, são justificáveis.

O limite para a nossa protagonista chega quando a sua casa é invadida e roubada. O criminoso levou um notebook, os remédios (ansiolítico e antidepressivo) e conjunto de talheres de prata que foi herança de sua avó. O detective encarregado faz pouco caso do acontecimento e ainda culpa Ruth por supostamente ter deixado a porta da casa aberta (ela não se lembra), pois não houve arrombamento. Outro preconceito do policial é com os remédios que a personagem toma.

Dentro de um mundo que só derruba ela e de um estado ineficiente, partimos para a segunda parte desta história. A transformação da personagem através do seu desejo de vingança que aos poucos ganha a superfície. É neste ponto que o seu vizinho Tony deixa de ser só mais um mal-educado no mundo, para se revelar um grande companheiro, ainda que excêntrico. É neste personagem de Elijah Wood, onde se apresentam as melhores situações cômicas do filme.

O enredo sai da dramédia para se enveredar pelo suspense/crime. Ruth luta “para que as pessoas não sejam cretinas”, por isso ela vai atrás do criminoso. Mas é exatamente isso que ela precisa se tornar, se quiser cumprir com o seu objetivo. “Qualquer um pode fazer qualquer coisa se deixarmos. Bem-vinda ao mundo”, diz um dos antagonistas. A transformação dos personagens em situações absurdas -quanto mais você enfia o pé na lama, mais afunda- lembra muito o estilo dos irmãos Coen. Tarantino pode ser evocado também no desfecho violento. A terceira parte do filme ainda oferece ação com uma sequência de perseguição. Tem algo de Django Livre, Fargo ou O Iluminado.

A salada de Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo é muito eficiente como entretenimento. Macon Blair assina o roteiro, estreia como diretor e faz uma ponta como ator, ele é o babaca do bar. O novato diretor foi produtor executivo de Green Room, outro ótimo filme de crime do ano passado, que tem muito em comum com este filme.

Diversão garantida para toda a família (sem ironia). Apesar do conteúdo em certas partes, o filme tem uma leveza de sessão da tarde em sua condução. Recomendado.

AHHHH E A TRILHA SONORA É DE MATAR. Vai de Echo and the Bunnymen até The Giraffes.

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